“Viemos ao mundo para dar nome às coisas: dessa forma nos tornamos senhores delas ou servos de quem as batizar antes de nós”. (Lya Luft, escritora)
Qualidade é um substantivo inerente ao ser humano e a seus afazeres. O ofício de educar, dentre outros, pressupõe qualidade. A qualidade é gerada na satisfação pela conquista de aprendizagens, protagonizadas por educadores e educandos. O prazer nas relações de ensino-aprendizagem está na construção do conhecimento como algo útil, agradável e capaz de desencadear alegria e realização. O educador é um dos maiores interessados em qualidade na educação; a escola carrega potenciais de sua satisfação, uma vez que o fracasso dos educandos também representa o seu próprio fracasso.
Quem ganha com a desqualificação da educação pública? Quem ganha quando os professores e professoras não são tratados com a dignidade que merecem? Quem goza de alguma vantagem quando os alunos de nossas escolas saem das mesmas sem condições de ler e interpretar o mundo, para melhor inserir-se nele? Ninguém, muito menos os professores ou os alunos, ou a sociedade.
É um avanço que a sociedade queira discutir qualidade na educação. É, no entanto, injusto e leviano supor que o insucesso da escola pública recaia unicamente sobre os professores e professoras, usando-se para tanto a meritocracia como uma forma de punição e seleção dos professores. Os professores e a comunidade escolar sabem do seu maior mérito: a resistência e a sobrevivência da escola pública, durante as últimas décadas.
Existem razões suficientes para querermos uma escola pública e de qualidade. No entanto, questiona-se a legitimidade das avaliações de seu desempenho sem uma ampla discussão e participação dos maiores interessados e sem uma ampla discussão na sociedade sobre o papel da educação no atual contexto histórico.
Rubem Alves, quando discute “Qualidade em educação”, lembra que “a educação, na medida em que lida com a vida das pessoas e a vida do país, deve ser a área mais rigorosamente testada e é preciso que seja excelente. Entretanto, é aquela em que os testes são mais difíceis e as avaliações, vestibulares e provões quase nada significam: nada garante que a qualidade, medida por critérios acadêmicos numéricos consiga passar os testes que a vida impõe”.
Alves afirma que as avaliações escolares sempre são anunciadas com a intenção de “consertar a máquina” (a estrutura dos sistemas de ensino). E logo responde: “eu, ao contrário, acho que não há nada de errado com a máquina. Não há o que consertar. Acontece que os alunos, mais precisamente os corpos dos alunos – tem também seus mecanismos de “controle de qualidade”. Se eles não aprendem é porque os seus corpos reprovam a máquina. Seus corpos vomitam o que a máquina lhes enfia goela abaixo. O resultado do “examão” seria a prova disso”. E pondera ainda que nosso corpo só aprende dois tipos de conteúdos: os que dão prazer e os que levam ao objeto de prazer (aqueles com razões para serem aprendidos). “A máquina funciona como deve. O problema é que a comida que ela serve é imprópria para a inteligência”.
Faz bom tempo que os educadores/as reclamam qualidade. Faz tempo que apontam impróprio o tratamento que os governos lhes dispensam. Todo este contexto pressiona seu ambiente de trabalho, fere suas inteligências e limita imensamente o seu prazer de ensinar. Há que se considerar ainda que todo tratamento impositivo se torna indigesto e que os muitos jeitos de fazer educação só merecem reconhecimento se ajudarem as pessoas a viver melhor no mundo, exercendo sua cidadania e sendo mais felizes. O resto, pouco ou nada tem a ver com qualidade.
Nei Alberto Pies, professor e ativista de direitos humanos
pies.neialberto@gmail.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Eu aguardo as sementes que você possa vir a lançar. Depois selecioná-las e plantar.