terça-feira, 31 de março de 2015

A IMPORTÂNCIA DO PLANEJAMENTO PEDAGÓGICO



Planejar é pensar sobre aquilo que existe, sobre o que se quer alcançar, com que meios se pretende agir. (OLIVEIRA. 2007. p.21).
A ação de planejar acompanha o homem desde os primórdios da evolução humana. Algumas pessoas planejam suas ações desde as mais simples até as mais complexas, na tentativa de transformar e melhorar suas vidas ou até das pessoas que as rodeiam. Não é apenas na vida pessoal que as pessoas planejam suas ações, o planejamento atinge várias esferas sociais. Mas, se o ato de planejar é tão importante, porque alguns ainda resistem em aceitar este fato, principalmente no contexto educacional? 

Diante desse questionamento é importante considerar que o planejamento educacional é um instrumento orientador de todo o processo educativo, pois constitui e determina as grandes necessidades, indica as prioridades básicas, ordena e determina todos os recursos e meios necessários para atingir as grandes finalidades da educação.
A educação, a escola e o ensino são os grandes meios que o homem busca para poder realizar o seu projeto de vida. Portanto, cabe à escola e aos professores o dever de planejar a sua ação educativa para construir o seu bem viver. (MENEGOLLA & SANT’ANNA, 2001, p.11).
Neste sentido, fica notória a importância tanto da escola como também dos professores na formação humana. Assim sendo, todas as ações educativas devem ter como perspectiva a construção de uma sociedade consciente de seus direitos e obrigações, sejam eles individuais ou coletivos. 

No entanto, apesar do planejamento escolar ser de grande importância, há professores que são negligentes na sua prática educativa, utilizando de improvisações para a realização de suas atividades em sala de aula.
A ausência de um processo de planejamento de ensino nas escolas, aliado às demais dificuldades enfrentadas pelos docentes do seu trabalho, tem levado a uma contínua improvisação pedagógica das aulas. Em outras palavras, aquilo que deveria ser uma prática eventual acaba sendo uma “regra”, prejudicando, assim, a aprendizagem dos alunos e o próprio trabalho escolar como um todo. (FUSARI, 2008, p.47) 
Segundo Moretto (2007, p.100), existe, ainda, a crença que a experiência do professor já é suficiente para ministrar aulas com competência. Professores com este pensamento ignoram a função do planejamento bem como asua importância. Outro aspecto que vem influenciando o ato de planejar são os materiais didáticos ou as instruções metodológicas para os professores que acompanham estes materiais.
Muitas vezes os professores trocam o que seria o seu planejamento pela escolha de um livro didático. Infelizmente, quando isso acontece, na maioria das vezes, esses professores acabam se tornando simples administradores do livro escolhido. Deixam de planejar seu trabalho a partir da realidade de seus alunos para seguir o que o autor do livro considerou como mais indicado. (BRASIL, 2006, p. 40).
O planejamento, de modo geral, tem sido considerado como uma transcrição para o papel de uma ideia e não como um processo que requer reflexão em relação à realidade em que se inserem os alunos e a própria escola. Para que a partir deste ponto busque-se a mudança da prática.
Mudar a mentalidade de que fazer planejamento é preencher formulários (mas ou menos sofisticados). Antes de mais nada, fazer planejamento é refletir sobre os desafios da realidade da escola e da sala de aula, perceber as necessidades, re-significar o trabalho, buscar formas de enfrentamento e comprometer-se com a transformação da prática. Se isto vai para um plano escrito depois, é um detalhe! (VASCONCELLOS, 1995. p. 59).
É fundamental quebrar o paradigma de que o planejamento é um ato simplesmente técnico. Este não pode ser visto como uma obrigação, algo que é exigido apenas por burocracia, mas como um eixo norteador na busca da autonomia, na tomada de decisões, nas resoluções de problemas e nas escolhas dos caminhos a serem percorridos. 

O importante é salientar que o planejamento sirva para o professor e para os alunos, que ele seja favorável e funcional a quem se destina, através de uma ação consciente e responsável, desconsiderando a noção de planejamento como uma receita pronta, pois cada sala de aula é uma realidade diferente, com problemas e soluções diferentes. Nesse sentido, cabe ao professor, em conjunto com os demais profissionais da escola, adaptar o seu planejamento,para que assegure o bom desenvolvimento a que ele se propõe, que é o de guiar as práticas docentes em sala de aula.



REFERÊNCIAS:

BRASIL. MEC – Ministério da Educação e Cultura. Trabalhando com a Educação de Jovens e Adultos – Avaliação e Planejamento – Caderno 4 – SECAD – Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade – 2006.

FUSARI, José Cerchi. O planejamento do trabalho pedagógico: algumas indagações e tentativas de respostas. Disponível em: <http://www.crmariocovas.sp.gov.br/pdf/ideias_08_p044-053_c.pdf.> Acesso em 10/110/2012.

LIBÂNEO, José Carlos, Didática. São Paulo. Editora Cortez. 1994

MENEGOLLA, Maximiliano. SANT’ANNA, Ilza Martins. Por que planejar? Como planejar? 10ª Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001.

MORETTO, Vasco Pedro. Planejamento: planejando a educação para o desenvolvimento de competências. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007.

OLIVEIRA, Dalila de Andrade. Gestão Democrática da Educação: Desafios Contemporâneos. 7ª edição. Petrópolis, RJ. Editora Vozes.

VASCONCELLOS, Celso dos Santos. Planejamento: Projeto de Ensino Aprendizagem e Projeto Político Pedagógico. 7ª edição. São Paulo 2000. Editora Liberdad.

Créditos da imagem: http://www.papelariatributaria.com.br/blog/artigos/educacao-infantil-ganha-assessoria-tecnica-pedagogica/

Planejamento escolar

Celso dos Santos Vasconcellos fala sobre planejamento escolar

Especialista critica a burocracia e diz que o coordenador pedagógico deve se aliar a outros colegas para não se sentir sozinho

celso vasconcellos planejamento
Foto: Rodrigo Eribe 
Celso dos Santos Vasconcellos já foi professor, coordenador pedagógico e gestor escolar. Ao longo de sua extensa carreira de educador, participou de inúmeros processos de planejamento nas escolas e gosta de dizer que aprendeu muitas lições. "Às vezes, há uma tentação enorme de ficar gastando tempo com problemas menores, quase sempre da esfera administrativa ou burocrática. Justamente por isso é tão importante planejar o planejamento", afirma. Doutor em Educação pela Universidade de São Paulo, mestre em História e Filosofia da Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e autor de diversos livros sobre esse assunto, o especialista fala na entrevista a seguir a respeito dos meandros do processo de elaboração das diretrizes do trabalho da escola. 


Por onde se deve começar um bom planejamento? 
CELSO VASCONCELLOS Depende muito da dinâmica dos grupos. Existem três dimensões básicas que precisam ser consideradas no planejamento: a realidade, a finalidade e o plano de ação. O plano de ação pode ser fruto da tensão entre a realidade e a finalidade ou o desejo da equipe. Não importa muito se você explicitou primeiro a realidade ou o desejo. Então, por exemplo, não há problema algum em começar um planejamento sonhando, desde que depois você tenha o momento da realidade, colocando os pés no chão. Em alguns casos, se você começa o ano fazendo uma avaliação do ano anterior, o grupo pode ficar desanimado - afinal, a realidade, infelizmente, de maneira geral, é muito complicada, cheia de contradições. Às vezes, começar resgatando os sonhos, as utopias, dependendo do grupo, pode ser mais proveitoso. O importante é que não se percam essas três dimensões e, portanto, em algum momento, a avaliação, que é o instrumento que aponta de fato qual é a realidade do trabalho, vai aparecer, começando o planejamento por ela ou não. 

É possível realizar um processo de ensino e aprendizagem sem planejar? 
VASCONCELLOS É impossível porque o planejamento é uma coisa inerente ao ser humano. Então, sempre temos algum plano, mesmo que não esteja sistematizado por escrito. Agora, quando falamos em processo de ensino e aprendizagem, estamos falando de algo muito sério, que precisa ser planejado, com qualidade e intencionalidade. Planejar é antecipar ações para atingir certos objetivos, que vêm de necessidades criadas por uma determinada realidade, e, sobretudo, agir de acordo com essas ideias antecipadas. 


Em alguns contextos, o planejamento ainda é encarado como um instrumento de controle? 
VASCONCELLOS Sim, em algumas escolas e redes, ele ainda é um instrumento burocrático e autoritário. Em um sistema autoritário, o planejamento é uma arma que se volta contra o professor porque o que ele disser - ou alguém disser por ele - que vai ser feito tem que ser cumprido. Caso contrário, ele foi incompetente. E, nem sempre, conseguimos fazer o que planejamos. Por diversas razões, inclusive por falha nossa, mas não unicamente por isso. No entanto, o movimento da sociedade e o processo de redemocratização têm favorecido o conceito de planejamento como real instrumento de trabalho e não como uma ferramenta de controle dos professores. 



Qual a relação entre o planejamento e o projeto político pedagógico? 
VASCONCELLOS Nesse processo de planejar as ações de ensino e aprendizagem, existem diversos produtos, como o projeto político pedagógico, o projeto curricular, o projeto de ensino e aprendizagem ou o projeto didático, que podem ou não estar materializados em forma de documentos. O ideal é que estejam. Quando falamos do planejamento anual das escolas, temos como referência o projeto político pedagógico. 

É possível fazer um planejamento sem conhecer o projeto político pedagógico da escola?
VASCONCELLOS
 Um projeto, a escola sempre tem, mesmo que ele não esteja materializado em um documento. Agora, o ideal é que esse projeto seja público e explicitado. Na hora do planejamento anual, ele deve ser usado como algo vivo, como um termômetro para toda a comunidade escolar saber se o trabalho que está sendo planejado está se aproximando daqueles ideais políticos e pedagógicos ou não. 

Como evitar que o tempo dedicado ao planejamento anual não seja desperdiçado?
VASCONCELLOS Nas escolas, o coordenador pedagógico é o responsável por esse processo. É preciso prever momentos específicos para cada tipo de assunto e ser firme na coordenação. Às vezes, há uma tentação muito grande em ficar gastando tempo do planejamento com problemas menores, administrativos ou burocráticos. Então, é muito importante planejar o planejamento, reservando momentos específicos para cada assunto, e ser rigoroso no cumprimento dessa organização. Ele precisa ser um coordenador pedagógico forte, mas onde buscar apoio para se fortalecer? Em alguns casos, há o apoio da direção, mas é muito importante que ele faça parte de um grupo com outros profissionais no mesmo cargo para trocar experiências e sentir que não está sozinho nesse trabalho. 



Com que frequência as ações do planejamento anual devem ser revistas pela equipe? 
VASCONCELLOS Eu insisto muito na reunião pedagógica semanal. Na minha opinião, esse encontro não deve ser por área, e sim com todos os professores daquele ciclo, daquele período. Se todos os professores, por exemplo, do ciclo II do Ensino Fundamental do período da manhã estão presentes no mesmo momento, em um dia fixo da semana, no período da tarde, durante cerca de duas horas, o coordenador pedagógico pode montar reuniões por área, ou por nível ou gerais, conforme as necessidades. Esse momento de encontro é imprescindível para planejar um trabalho de qualidade com coerência entre os professores. Além de ser um momento de socialização. Existem professores que descobrem coisas excelentes que vão morrer com ele porque não foram sistematizadas nem ele compartilhou aquelas descobertas. E, na hora do planejamento, há a possibilidade de reservar um momento para isso. 



Existe algum momento que deve ser planejado com mais cuidado? 
VASCONCELLOS Sim, as primeiras aulas. Principalmente das séries iniciais. Existem estudos que mostram que a boa relação professor/aluno pode ser decidida nessas aulas. Há pesquisas que vão além e apontam os primeiros instantes da primeira aula como determinantes do sucesso da atividade docente. Então, se o professor tem de preparar bem todas as aulas, as primeiras precisam de mais cuidado. E não é só determinar os conteúdos a ser abordados, os objetivos a atingir e a metodologia mais adequada. É, sobretudo, se preparar, tornar-se disponível para aqueles alunos, acreditando na possibilidade do ensino e da aprendizagem, estando inteiramente presente naquela sala de aula, naquele momento.

segunda-feira, 30 de março de 2015

Professor Renato Janine Ribeiro

é o novo ministro da Educação

Filósofo, docente aposentado da USP tomará posse no próximo dia 6.
Ele sucederá Cid Gomes, que se demitiu após crise com deputados.

Filipe MatosoDo G1, em Brasília
Renato Janine Ribeiro, professor de Ética e Filosofia Política da USP, durante debate em março de 2010  (Foto: J. F. Diorio/Estadão Conteúdo)Renato Janine Ribeiro, professor de Ética e Filosofia
Política da USP, durante debate em março de 2010
(Foto: J. F. Diorio/Estadão Conteúdo)
A Presidência da República anunciou no início da noite desta sexta-feira (27) que o professor Renato Janine Ribeiro será o novo ministro da Educação. A informação foi antecipada peloBlog do Camarotti. A posse do novo ministro será no próximo dia 6 (confira a repercussão).
Professor aposentado da Universidade de São Paulo (USP), Janine Ribeiro assumirá o comando do MEC no lugar de Cid Gomes, que deixou a pasta na semana passada após um conflito com deputados em sessão da Câmara.
Janine Ribeiro é o quinto ministro da Educação desde o início do primeiro mandato de Dilma Rousseff, em janeiro de 2011. Antes dele, passaram pela pasta Fernando Haddad, atual prefeito de São Paulo; Aloizio Mercadante, hoje ministro da Casa Civil; José Henrique Paim; e Cid Gomes. Desde a saída de Gomes, o secretário-executivo da pasta, Luiz Claudio Costa, chefiava o MEC interinamente. Segundo o G1 apurou, ele foi convidado por Janine Ribeiro para permanecer como secretário-executivo.
Há cerca de uma semana, ao negar uma reforma ministerial, a presidente Dilma afirmou que o Ministério da Educação não entraria na divisão partidária do governo, já que, segundo ela, trata-se de um dos ministérios "mais importantes do país".
"O MEC não é dado para ninguém. O MEC é um dos ministérios mais importantes do país porque eu tenho o compromisso de construir um caminho para a educação brasileira dando mais passos do que nós já demos", afirmou, após ser questionada sobre se, com a saída de Cid Gomes, a pasta seria “devolvida” ao PT ou “entregue” ao PMDB.
Doutor em filosofia, Renato Janine Ribeiro ensinava ética e filosofia política na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP. Entre os cargos que ocupou está o de presidente da Comissão de Cooperação Internacional da USP (CCInt), entre 1991 e 1994, e secretário e conselheiro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), entre 1997 e 1999. Também foi diretor de avaliação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), de 2004 a 2008, quando coordenou mais de 2,5 mil cursos de mestrado e doutorado do Brasil.
Janine Ribeiro publicou diversos livros na área de filosofia e ciência política, entre os quais "A sociedade contra o social: o alto custo da vida pública no Brasil", obra vencedora do Prêmio Jabuti 2001 na área de ensaios e ciências humanas.
Nesta sexta, também foi anunciado o novo ministro da Secretaria de Comunicação Social, Edinho Silva, tesoureiro da campanha à reeleição da presidente Dilma Rousseff.
Nota
Leia abaixo nota oficial sobre a nomeação de Renato Janine Ribeiro divulgada pelo Palácio do Planalto.
NOTA OFICIAL

A presidenta da República Dilma Rousseff convidou nesta sexta-feira (27) o professor doutor Renato Janine Ribeiro para assumir o cargo de ministro da Educação.
A posse do novo ministro será no dia 6 de abril.

Perfil
Renato Janine Ribeiro tem formação em Filosofia pela Universidade de São Paulo (USP), mestrado pela Université Paris 1 Pantheon-Sorbonne, doutorado pela USP e pós-doutorado pela British Library. É professor titular de Ética e Filosofia Política da USP.

Tem 18 livros editados, além de inúmeros ensaios e artigos em publicações científicas. Em 2001, recebeu o prêmio Jabuti de melhor ensaio.

O novo ministro foi membro do Conselho Deliberativo do CNPq (1993-1997), do Conselho da SBPC (1997-1999), secretário da SBPC (1999-2001) e diretor de Avaliação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) (2004-2008). Além disso, atuou como membro do Conselho Deliberativo do Instituto de Estudos Avançados da USP e é membro do Conselho Superior de Estudos Avançados da FIESP.
Secretaria de Imprensa
Presidência da República

PARA QUE SERVE A EDUCAÇÃO?


Frei Betto
Uma educação crítica e cooperativa é capaz de reproduzir as bases materiais e espirituais de uma sociedade baseada na solidariedade.
A educação detém o poder de destronar uma racionalidade dominante para introduzir outra, desde que não seja meramente teórica e se vincule a processos efetivos de produção material da existência.
Não diferimos dos animais por nossa capacidade de pensar, e sim de reproduzir nossos meios de sobrevivência.
Uma educação libertadora é a que almeja conquistar hegemonia por consenso, por práticas efetivas, e não por coerção ideológica. Deve abranger todas as disciplinas escolares, das ciências exatas à educação física, superando relações fundadas na economia de trocas para a economia solidária, baseada na cooperação.
As relações mercantilistas influem nas concepções daqueles que as adotam ou se deixam reger por elas, pois acentuam o individualismo e induzem os educandos a acreditar que o mercado obedece a uma “lei natural”, e que fora dele não há alternativa... É isso que nos leva a, literalmente, torturar a natureza para que ela nos forneça seus frutos o quanto antes.
Há que perguntar: para que serve a educação? Para adaptar os educandos ao status quo? Para transmitir o patrimônio cultural da humanidade como se ele resultasse da ação destemida de heróis e gênios? Para formar mão de obra qualificada ao mercado de trabalho? Para adestrar indivíduos competitivos?
Um educação crítica e solidária engloba todos os atores da instituição escolar: alunos, professores, funcionários e suas respectivas famílias. E ultrapassa os muros da escola para se vincular participativamente ao bairro, à cidade, ao país e ao mundo.
As portas da escola permanecem abertas a movimentos sociais, atores políticos, artistas, trabalhadores. E a ótica de seu processo pedagógico enfatiza esta verdade que a lógica mercantilista tenta encobrir: tanto a evolução da natureza quanto a história da humanidade têm seus fundamentos muito mais centrados na cooperação, na solidariedade, que na seleção natural, na competitividade e na exclusão.
O valor da escola se avalia por sua capacidade de inserir educandos e educadores em práticas sociais cooperativas e libertadoras. Por isso é indispensável que a escola tenha clareza de seu projeto político pedagógico, em torno do qual deve prevalecer o consenso de seus educadores. Sem essa perspectiva, a escola corre o risco de ficar refém da camisa de força de sua grade curricular, como mero aparelho burocrático de reprodução bancária do saber.
Reinventar o futuro é começar por revolucionar a escola, transformando-a em um espaço cooperativo no qual se intercalem a formação intelectual (consciência crítica), científica e artística de protagonistas sociais comprometidos eticamente com os desafios de construir outros mundos possíveis, fundados na partilha dos bens da Terra e dos frutos do trabalho humano.
Frei Betto é escritor, autor, em parceria com Mário Sérgio Cortella, de “Sobre a esperança” (Papirus), entre outros livros.

segunda-feira, 23 de março de 2015

Zygmunt Bauman:

 "É possível que já estejamos em plena revolução"


“Hoje, os jovens que não perderam a ambição com as amargas experiências de trabalho sonham em ir para o Vale do Silício. É a meca das ambições de todo jovem, a ponta da lança da inovação, do progresso. Sabe qual é a média de um trabalhador em uma empresa do Vale do Silício? Oito meses." - Zygmunt Bauman
O sociólogo polônes Zygmunt Bauman, em entrevista à MGMagazine, fala, aos 89 anos, sobre o mundo atual e como entende os efeitos da modernidade sobre as pessoas. “As consequências são a austeridade, o aumento do desemprego e, sobretudo, a devastação emocional e mental de muitos jovens que entram agora no mercado de trabalho e sentem que não são bem-vindos, que não podem adicionar nada ao bem-estar da sociedade, porque são uma carga", diz.
MGMagazine: O senhor imaginou que poderia se tornar uma estrela midiática em nível global?
Zygmunt Bauman: Certamente não. Mas não sou uma estrela. Quando eu morrer, o que provavelmente acontecerá logo, com certeza morrerei como uma pessoa insatisfeita, que não alcançou seu objetivo.

MGMagazine: Por quê?
Zygmunt Bauman: Porque tratei de transmitir certas ideias durante toda a minha vida, que tem sido muito longa. E quando olho pra trás, existe toda uma montanha cinza de esperanças e expectativas que morreram ao nascer ou faleceram muito jovens. Não tenho nada para me gabar. Tento juntar palavras para dizer às pessoas quais são os problemas, de onde eles vêm, onde se escondem, como encontrar ajuda para resolvê-los se for possível. Mas são palavras. E não nego que são poderosas, porque a nossa realidade, o que nós pensamos que é o mundo, esta sala, nossa vida, nossas lembranças, são palavras. Mas, apesar de ter vivido tantos anos, não consegui resolver o problema de transformar as palavras em carne. Hoje, existe uma enorme quantidade de pessoas que querem a transformação, que têm ideias de como tornar o mundo melhor não somente para eles, mas também para os outros, mais hospitaleiro. Mas na sociedade contemporânea, na qual somos mais livres do que nunca, ao mesmo tempo somos também mais impotentes do que em qualquer outro momento da história. Todos sentimos a desagradável experiência de ser incapazes de mudar qualquer coisa. Somos um conjunto de indivíduos com boas intenções, mas entre as intenções e os projetos e a realidade tem muita distância. Todos sofremos agora mais do que em qualquer outro momento pela falta total de agentes, de instituições coletivas capazes de atuar efetivamente.

MGMagazine: O que mudou?
Zygmunt Bauman: Quando eu era jovem, todos os meus contemporâneos, de esquerda, direita ou centro, coincidiam em um ponto: se chegamos ao governo ou fazemos uma revolução, sabemos o que fazer e como fazer através do poder do Estado. Agora, ninguém acredita que o governo pode fazer algo. Os governos são vistos como instituições que nunca cumprem suas promessas. É um grave problema. Porque significa que, embora saibamos como criar uma sociedade mais humana – e no momento abandonamos a esperança de poder projetá-la–, a grande pergunta, para a qual não tenho resposta, é quem vai transformá-la em realidade.

MGMagazine: Viver em um mundo líquido, o que isso significa exatamente?
Zygmunt Bauman: Modernidade significa modernização obsessiva, viciante, compulsiva. Modernização significa não aceitar as coisas como elas são, e sim transformá-las em algo que consideramos que é melhor. Modernizamos tudo. Você pega as suas regulações, seus objetos, e trata de modernizá-los. Não duram muito tempo. Isso é o mundo líquido. Nada tem uma forma definida que dure muito tempo. Deve-se dizer que fundir o que é sólido, transformá-lo em líquido e moldá-lo de novo era uma preocupação da modernidade desde o princípio, mas o objetivo era outro. Arbitrariamente, mas acredito que de forma útil, situo o início da modernidade no ano de 1.775 no terremoto de Lisboa, seguido de um incêndio que destruiu o que restava e em seguida um tsunami que levou consigo tudo para o mar.

MGMagazine: Por que nesse terremoto?
Zygmunt Bauman: Foi uma catástrofe, não só material, mas também intelectual. As pessoas pensavam, até então, que Deus tinha criado tudo, que tinha criado a natureza e disposto leis. Mas, de repente, veem que a natureza é cega, indiferente, hostil com os humanos. Não se pode confiar nela. O mundo tem que estar sob direção humana. Substituir o que existe pelo que se pode projetar. Assim, Rousseau, Voltaire ou Holbach viram que o antigo regime não funcionava e decidiram que tinham de fundi-lo e refazê-lo de novo no molde da racionalidade. A diferença em relação ao mundo de hoje é que não o faziam porque não gostavam do que era sólido, e sim, pelo contrário, porque acreditavam que o regime que existia não era suficientemente sólido. Queriam construir algo resistente para sempre que substituísse o oxidado. Era a época da modernidade sólida. A época das grandes fábricas empregando milhares de trabalhadores em enormes edifícios de tijolos, fortalezas que iam durar tanto quanto as catedrais góticas. No entanto, a história decidiu um caminho muito diferente.

MGMagazine: Tornou-se líquida?
Zygmunt Bauman: Sim. Hoje a maior preocupação da nossa vida social e individual é como prevenir que as coisas sejam fixas, que sejam tão sólidas que não possam mudar o futuro. Não acreditamos que existam soluções definitivas, e não é só isso: não gostamos delas. Por exemplo: a crise que muitos homens têm ao fazer 40 anos. Ficam paralisados pelo medo de que as coisas já não sejam como antes. E o que mais lhes dá medo é ter uma identidade aferrada a eles. Uma imagem que não se pode tirar. Estamos acostumados com um tempo veloz, certos de que as coisas não vão durar muito, de que vão aparecer novas oportunidades que vão desvalorizar as existentes. E isso acontece em todos os aspectos da vida. Há duas semanas, as pessoas faziam filas durante a noite pelo iPhone 5 e agora mesmo estão fazendo pelo 6. Posso garantir que em dois anos aparecerá o 7 e milhões de iPhones 6 serão jogados no lixo. E isso dos objetos materiais funciona da mesma forma com as relações pessoais e com a própria relação que temos conosco mesmos, como nos avaliamos, que imagem temos de nossa pessoa, que ambição permitimos que nos guie. Tudo muda de um momento a outro, somos conscientes de que somos transformáveis e, portanto, temos medo de fixar qualquer coisa para sempre. Provavelmente, seu governo, como o do Reino Unido, convoca seus cidadãos a serem flexíveis.

MGMagazine: Sim, convoca.
Zygmunt Bauman: O que significa ser flexível? Significa que você não está comprometido com nada para sempre, mas sim pronto para mudar a sintonia, a mente, em qualquer momento no qual seja requisitado. Isso cria uma situação líquida. Como um líquido em um copo, no qual o mais leve empurrão muda a forma da água. E isso está em todos os lugares.

MGMagazine: Quais o senhor acredita que são os efeitos desta nova situação nas pessoas?
Zygmunt Bauman: Há alguns anos, os jovens iam trabalhar para a Ford ou a Fiat como aprendizes e podiam acabar ficando ali pelos próximos 40 anos se não se embebedavam ou morriam antes. Hoje, os jovens que não perderam a ambição depois de ter amargas experiências de trabalho sonham em ir ao Vale do Silício. É a meca das ambições de todo homem jovem, a ponta da lança da inovação, do progresso. Você sabe qual é a média de um trabalhador de uma empresa do Vale do Silício? Oito meses. O sociólogo Richard Sennet calculou, há uns anos, que o trabalhador médio mudaria de empresa onze vezes durante a sua vida. Hoje, essa quantidade é inclusive maior. As gerações que emergem das universidades em grandes quantidades estão ainda buscando emprego. E se encontram, não tem nada a ver com suas habilidades e expectativas. Estão empregados em trabalhos precários, temporários, sem segurança, sem carreira. Então, a principal maneira pela qual nos conectamos com o mundo, que é a nossa profissão, nosso trabalho, é fluida, líquida. Estamos conectados apenas pela água. E não se pode estar conectado por isso, ocorrem inundações, fugas...

MGMagazine: Por isso você diz que passamos do proletariado ao precariado?
Zygmunt Bauman: Há não muito tempo o precariado era a condição de vagabundos, sem-teto, mendigos. Agora, marca a natureza da vida de pessoas que há 50 anos estavam bem instaladas. Pessoas de classe média. Com exceção do 1% que está acima de tudo, ninguém pode se sentir seguro hoje. Todos podem perder as conquistas alcançadas durante sua vida sem aviso prévio. Não faz tantos anos, seis, o crédito e os bancos entraram em colapso e as pessoas começaram a ser despejadas de suas casas e seus trabalhos. Antes disso, os otimistas falavam de orgia de consumo, as pessoas pensavam que podiam gastar dinheiro que não tinham porque as coisas seriam cada vez melhores, assim como seus rendimentos, mas tudo isso desabou. As consequências são hoje os cortes, a austeridade, o alto nível de desemprego e, sobretudo, a devastação emocional e mental de muitos jovens que entram agora no mercado de trabalho e sentem que não são bem-vindos, que não podem acrescentar nada ao bem-estar da sociedade, que são um peso.

MGMagazine: Aumenta o que o senhor chama de vidas desperdiçadas.
Zygmunt Bauman: Cada vez há mais. Mas é que, além disso, as pessoas que têm emprego experimentam a forte sensação de que existem altas possibilidades de que também virem resíduos. E, mesmo conhecendo a ameaça, são incapazes de preveni-la. É uma combinação de ignorância e impotência. Não sabem o que vai acontecer, mas nem mesmo sabendo seriam capazes de preveni-lo. Ser o resto, um resíduo, é uma condição ainda de uma minoria. No entanto, impacta não somente os empobrecidos, mas também setores cada vez maiores das classes médias, que são a base de nossas sociedades democráticas modernas. Estão atribuladas.

MGMagazine: As classes médias vão desaparecer?
Zygmunt Bauman: Estamos em um interregno. A palavra foi usada pela primeira vez na história da Roma Antiga. O primeiro rei lendário foi Rômulo, que reinou por 38 anos. Essa era a expectativa de vida das pessoas, então, quando ele morreu, pouca gente lembrava do mundo sem ele. As pessoas estavam confusas. O que fazer? Rômulo lhes dizia o que fazer. E se houvesse outro, ninguém sabia o que ele lhes pediria. Gramsci atualizou a ideia de interregno para definir uma situação na qual as antigas formas de fazer as coisas já não funcionam, mas as formas de resolver os problemas de uma nova maneira efetiva ainda não existem ou não as conhecemos. E nós estamos assim. Os governos vivem presos entre duas pressões impossíveis de reconciliar: a do eleitorado e a dos mercados. Eles têm medo de que, se não agem como as bolsas e o capital móvel querem, as bolsas quebrarão e o dinheiro irá a outro país. Não se trata apenas de que possa haver corrupção e estupidez entre os nossos políticos, mas sim que essas situações os deixam impotentes. E, por isso, as pessoas buscam desesperadamente novas formas de fazer política.

MGMagazine: Como os indignados?
Zygmunt Bauman: É um bom exemplo. Se o governo não cumpre, vamos à praça pública. Mas é uma boa tentativa que não traz muito resultado. Estamos tentando. Tentando criar alternativas praticáveis para atender às necessidades coletivas. O interregno por definição é transitório. Eu acredito que não viverei para ver o novo arranjo, mas sua vida estará repleta de buscas por essas alternativas. Porque este período de suspensão, no qual muitas coisas vão mal e temos poucas ideias para resolvê-las, não é eternamente concebível.

MGMagazine: Será que já não estamos líquidos demais?
Zygmunt Bauman: As mudanças vêm e vão. Muita gente está hoje convencida de que já existem alternativas, mas que são invisíveis porque ainda estão muito dispersas. Jeremy Rifkin fala da utilidade pública colaborativa. Benjamin Barber publicou o livro Se os prefeitos governassem o mundo, no qual diz que os estados estão acabados, que foram uma boa ferramenta para a separação, a independência e a autonomia, mas que em nossos tempos de interdependência devem ser substituídos. Que as instituições locais são capazes de enfrentar os problemas muito melhor, têm a dimensão adequada para ver e experimentar sua coletividade como uma totalidade. Podem levar adiante lutas muito mais efetivas para melhorar as escolas, a saúde, o emprego, a paisagem. Pede um tipo de Parlamento mundial de prefeitos das grandes cidades. Um Parlamento onde as pessoas falem e compartilhem experiências que são altamente parecidas. E as mudanças podem já estar aqui. Minha tese, quando eu estudava, foi sobre os movimentos operários na Grã Bretanha. Pesquisei nos arquivos do século XIX e nos jornais. Para minha surpresa, descobri que até 1875 não se mencionava que estava acontecendo uma revolução industrial, havia apenas informações dispersas. Que alguém tinha construído uma fábrica, que o teto de uma fábrica desabou... Para nós, é óbvio que estavam no coração de uma revolução, para eles, não. É possível que, quando você for entrevistar alguém dentro de 20 anos, essa pessoa lhe diga: “Quando você entrevistou o Bauman em Leeds, vocês estavam no meio de uma revolução e o senhor perguntava a ele sobre mudanças".

Zygmunt Bauman: Estamos isolados em rede?



“As relações humanas não são mais espaços de certeza, tranquilidade e conforto espiritual. Em vez disso, transformaram-se numa fonte prolífica de ansiedade. Em lugar de oferecerem o ambicionado repouso, prometem uma ansiedade perpétua e uma vida em estado de alerta. Os sinais de aflição nunca vão parar de piscar, os toques de alarme nunca vão parar de soar." - Zygmunt Bauman
Em tempos líquidos, a crise de confiança traz consequências para os vínculos que são construídos. Estamos em rede, mas isolados dentro de uma estrutura que nos protege e, ao mesmo tempo, nos expõe. É isso mesmo? O sociólogo polonês Zygmunt Bauman, em seu livro Medo líquido, diz que estamos fragilizando nossas relações e, diante disso, nos contatamos inúmeras vezes, seja qual for a ferramenta digital que usamos, acreditando que a quantidade vai superar a qualidade que gostaríamos de ter.
Bauman diz que, nesses tempos líquidos-modernos, os homens precisam e desejam que seus vínculos sejam mais sólidos e reais. Por que isso acontece? Seriam as novas redes de relacionamento que são formadas em espaços digitais que trazem a noção de aproximação? Talvez sim, afinal a conexão com a rede, muitas vezes, se dá em momentos de isolamento real. O sociológo, então, aponta que, quanto mais ampla a nossa rede, mais comprimida ela está no painel do celular. “Preferimos investir nossas esperanças em 'redes' em vez de parcerias, esperando que em uma rede sempre haja celulares disponíveis para enviar e receber mensagens de lealdade", aponta ele.
E já que as novas sociabilidades, aumentadas pelas pequenas telas dos dispositivos móveis, nos impedem de formar fisicamente as redes de parcerias, Bauman diz que apelamos, então, para a quantidade de novas mensagens, novas participações, para as manifestações efusivas nessas redes sociais digitais. Tornamo-nos, portanto, seres que se sentem seguros somente se conectados a essas redes. Fora delas os relacionamentos são frágeis, superficiais, “um cemitério de esperanças destruídas e expectativas frustradas".
A liquidez do mundo moderno esvai-se pela vida, parece que participa de tudo, mas os habitantes dessa atual modernidade, na verdade, fogem dos problemas em vez de enfrentá-los. Quando as manifestações vão para as ruas, elas chamam a atenção porque se estranha a formação de redes de parceria reais. “Para vínculos humanos, a crise de confiança é má notícia. De clareiras isoladas e bem protegidas, lugares onde se esperava retirar (enfim!) a armadura pesada e a máscara rígida que precisam ser usadas na imensidão do mundo lá fora, duro e competitivo, as 'redes' de vínculos humanos se transformam em territórios de fronteira em que é preciso travar, dia após dia, intermináveis conflitos de reconhecimento."

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